Todo o tempo eu esperei que alguma coisa melhor viesse. Não veio. Até agora, não. A cadeira já está com o assento marcado dos anos que passei somente esperando, e só fui perceber agora porque tive que levantar porque tive que sair. O espontâneo esqueceu meu endereço. Ênfase para a oração condicional ali atrás, tudo na minha vida funciona assim: isso por aquilo. Fui à mercearia, comprar uma foice e algumas palavras. A foice tinha que ter o cabo vermelho, porque se eu me cortar, posso ao menos esconder o sangue, já que as lágrimas são impossíveis de esconder; e tem que ter uma lâmina tão afiada, que possa cortar meu anoitecer e toda minha revolta, sem fazer ruído. E na secção de palavras, aquela entre a de biscoitos e a de produtos de limpeza doméstica, encontrei a prateleira que queria vazia. É incrível como sempre levam antes aquilo que queremos. Agora que mais uma vez estou decepcionado, vou para casa dormir um pouco. Serviço duro eu terei - que o duro, seja visto como uma hipérbole. Amanhã, Ah! quando for amanhã - se eu não decidir que seja o próximo do próximo amanhã, ou o próximo do próximo do próximo - vou acordar bem cedinho, naquele horário em que o sol ainda se espreguiça na cama, e vou para o meu quintal. Bem, é um quintal razoável, com algumas árvores secas e uns três ou quatro pés de esperança aqui e ali. Plantei dois girassóis há algum tempo e pedi que, junto a eles, crescesse também o meu amor. Vou cortá-los. Brotaram, e desenvolvem-se tão raquíticos que é um injúria esperar que as flores também desabrochem assim. Sendo que são a única coisa que tenho crescendo, não é estupidez vê-los dessa forma e esperar que me surpreendam? Ah, por favor, o que não presta arrancamos logo. E como não comprei nenhuma boa palavra vou apenas limpar, arar e deixar os dois espaços abertos no terreno infértil. Quem sabe não nasce alguma coisa? Tem chovido tanto na minha vida que seja possível que finalmente alguma coisa venha a se enraizar, e me dar alguns bons frutos.
Ou não, sejamos realistas.
Há que endurecer-se, mas sem jamais perder a ternura.
(Che Guevara)
8 comentários:
é qe nem diz uma musica, a gente vive pra esperar e espera pra esperar, mais como dizem as pessoas, paciência é tudo, o que eu ainda não tenho certeza poq odeio esperar =/
adorei o texto.
Brutal, existencial, algumas partes muito divinas.
'esconder o sangue com a foice vermelha'... isso é muito bom de se ler, uma granda sacada poética que eu senti vontade de ter escrito.
Olha, eu sempre digo. Ame a chuva.
"Há que endurecer-se, mas sem jamais perder a ternura." Ótimo texto!! Expressou muito bem essa frase.
O que não presta arrancamos logo, mas há sempre de vir bons frutos, dai vem o precioso "Tempo", à nos deixar impacientes. Será que o que resta é esperar pelo amanhã??? Ah estamos perdidos....(rsrs)"sejamos realistas"
Beijos na Alma
>>Dani
Você consegue desabrochar a tua própria consciência de reflexão, Cristiano
É inevitável, mas a sua condição de expor seus sentires, seus anseios, suas sensações e intensidades particulares acaba por derramar-se sobre nós, pelo menos tudo que você expõe aqui eu consigo captar de cá...
Talvez, a sensibilidade tua poética me defina...não sei bem, mas eu gosto e me sinto próximo das sensações.
Este teu texto monta toda uma realidade que me identifico...fala da espera, do cotidiano de alguém que espera a própria manifestação da esperança dentro de si e jamais acha...ou talvez ache, encontre, tateia, porém não acredita em si a ponto de observar que a vida concebe a própria noção de espontaneidade e esperança. Há sentimento...há verdades.
E se planta girassol é por que nasce e brota esperança dentro de ti, não?
Te sigo.
É como eu sempre digo, nem tudo é como queremos. E pior é que quanto mais ansiamos por algo, mas distante fica esse objeto de desejo. O jeito é deixar-mos o tempo resolver isso por nós e pôr novamente as coisas no seu devido lugar.
ótimo texto, pra variar.
Abraço.
A gente nem sempre encontra o que queremos né, mas buscar já é um começo, há que ter sempre esperança em bons frutos...
Cara, esse foi o seu texto que eu mais gostei, você brincou com as palavras de uma maneira maravilhosa.
Parabéns...
Abraços!
Que belo texto! Escrito com verdade, e sentimento.
Na vida é preciso sim, arrancar o que não presta, o que nos faz sofre, não merece estar em nosso jardim, cercando nosso amores, isso fere a alma...
E sim, é preciso confiar na chuva, nos bons frutos que ela ainda pode nos trazer
Simplesmente um belíssimo texto!
Letícia
Mas meu menino mais doce...vou te pegar aí, colocar no meu colo, e te fazer sorrir...
você é uma graça, como escreve!Meus parabéns...
Amo estar aqui...você é um SHOW!
beijocas!
Bia
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